Abri uma loja de fotos e explico a razão para isso.
Samuel, 1
Samuel,
Demorei para publicar esse texto porque fiquei o dia todo por conta de você. Estamos acompanhando a mamãe em uma viagem de trabalho e dedicamos o dia de hoje para explorarmos a estrutura do hotel. Sei que amou a piscina de bolinhas, porque você entrou sozinho: subiu os dois degraus, virou desceu olhando pra borda. Ali, resolveu arremessar 55 dessas bolinhas para fora.
Há um ano, você chegou. Te vi pela primeira vez quando você apareceu por cima dos panos do campo cirúrgico na sala da cesariana. O neném mais lindo do mundo que me fez lembrar dos primeiros versos de “Isn’t She Lovely” do Stevie Wonder: “Isn’t she lovely / Isn’t she wonderful / Isn’t she precious / Less than one minute old”. Cantei mentalmente, mas depois fiquei pensando que eu deveria ter colocado esse comecinho pra fora, mesmo desafinado, porque era o que meu coração pedia naquela hora.
E tudo começou na noite anterior. Você anunciou que vinha chegando pra brincar no nosso quintal quando eu e sua mãe voltávamos pra casa depois de jantar com vovó Pilar, vovó Tânia e vovô Fernando. Você abre um sorriso muito gostoso quando os vê, inclusive! Aquela contração no meio da rua não era de treinamento, ela era de verdade.
Aí, atravessamos a madrugada, primeiro em casa e depois no hospital. Eu tentando ajudar como dava, sendo um roadie/assistente e um espectador de um maravilhoso espetáculo de dança entre você e sua mãe. Maravilhoso, sonoro, visceral. Sua mãe tentou de todas as formas, mas você não queria sair. As coisas foram do seu jeito logo de partida.
A gente sabia que o começo da vida não seria fácil. E vimos de tudo um pouco nos seus primeiros 19 dias: tomografia, pneumotórax, intubação, ressonância, cirurgia para retirar a massinha que veio junto com você em sua boquinha. Jamais imaginei que o desfecho seria diferente de você saindo em nossos braços e ganhando o mundo, mas cara, quanta angústia.
Hoje, quem te vê aqui, lindo, saudável e forte, não consegue imaginar a delícia que é poder te ver crescer e se divertir com seu repertório de palavras: “água”, “papai”, “mamãe” e Stella em PT-SA – o português do Samuel.
Nas observações, nas brincadeiras, passeios e nas madrugadas infinitas, tenho a certeza de que você nos faz pessoas melhores e pai e mãe mais responsáveis e comprometidos em fazer o que for possível para você se desenvolver de forma integral.
Feliz aniversário, Leãozinho. Te amo, e de novo, obrigado por cada dia até aqui.
42
– A Resposta à Grande Questão… – disse o Pensador Profundo.
– Sim…!
– …da Vida, o Universo e Tudo Mais… – disse o Pensador Profundo, e fez uma pausa.
– Sim…!
– Quarenta e dois – disse o Pensador Profundo, com uma majestade e uma tranqüilidade infinitas.
Esse trecho veio de um livro que adoro, o “Guia do Mochileiro das Galáxias”. Esperei 20 anos para usar como tema para o texto de aniversário.
E é isso. Hoje completo 42 anos. Recebi a resposta para a grande questão da vida, o universo e tudo mais. Tal qual o livro, ainda não descobri a pergunta, embora tenho algumas hipóteses.
A Grande Questão envolve olhar pra dentro, ver que a cabeça não está funcionando bem para além do que as ressonâncias conseguem enxergar e assumir que é preciso pedir ajuda. Para tanto, também é importante descer de um pedestal de “arrogância intelectual”, admitir que “tudo sei que nada sei” e que não tenho a solução para todos os problemas, especialmente os da saúde mental.
A Grande Questão envolve olhar para um espelho e ser mais carinhoso e cuidar melhor do que eu vejo. Não sou uma lata velha que não tem mais conserto, é bom aceitar elogios, é fundamental me elogiar. Em outra esfera, colocar limites, não ter medo de ocupar e delimitar espaços. Me posicionar.
Significa calibrar melhor a visão e saber que posso ser tão grande feito o mundo. E largar a escala real – uma pessoa de 1,83m morando em um planeta de 40 mil km de circunferência na sua parte mais larga – como referência para quem eu sou, o que eu quero, o que eu posso.
Sentir ainda mais orgulho das coisas que fiz e aprender com as experiências que tive. E não falo somente da epítome da beleza chamada Samuel, dividir a vida com uma mulher absolutamente incrível que é a Carol ou ter a família que eu tenho, porque isso é fácil. Falo dos dias ruins ou das vezes que me boicotei por achar que não sou digno dessa experiência (e caberia uma imensa caixa de seleção aqui). Olhar para esses casos e fazer de tudo para não passar por isso novamente.
Continuar olhando o mundo com um olhar contemplativo e curioso. Compartilhar o que vejo, o que escuto, o que registro. Ao mesmo tempo, utilizar essa potência criativa como ferramenta para dar ordem no caos dos pensamentos que correm nessa autoestrada maluca dentro da minha cabeça.
E finalmente, a Grande Questão passa por celebrar o amor, o carinho e agradecer por todas as coisas bonitas que escuto hoje e todos os dias. Muitas vezes não é fácil aceitar e acreditar nisso. Estar no lado mais cinzento das coisas é mais confortável, ao mesmo tempo que é bem doloroso. E cansa. Já deu.
42 pode ser a resposta para a grande questão. E pode ser um recomeço.
Que seja bom.
Samuel v0.11
Que seja um bom texto de despedida.
Ontem, 22/07, Samuel completou 11 meses. Na hora do parabéns do mesversário, com o bolo que a vovó Pilar comprou e que também fez a alegria do escritório hoje, percebemos que estávamos cantando o parabéns mensal pela última vez. E escrever essa frase me trouxe sentimentos mistos.
De todas as versões mensais, acho que a v0.11 do Samuel é a que apresenta mais mudanças, avanços e descobertas em relação às anteriores. Ele aponta, se comunica, tem uma biblioteca de sons que é muito engraçada, faz dramas homéricos quando é deitado no trocador. O sorriso está no plural, são sorrisos, risadas e gargalhadas de mostrar os dentes que agora são quatro, dois embaixo e dois em cima.
Ele sai engatinhando e o som das mãozinhas batendo no piso é um dos mais gostosos. Só perde para a gargalhada quando apostamos corrida em quatro apoios, e se eu sou mais rápido, ele tem os joelhos em melhores condições e isso faz muita diferença. Outro som delicioso – menos para o vizinho de baixo – é o da escadinha montessoriana sendo arrastada pela sala, e ela é o apoio para o rapazinho que ensaia seus primeiros passos.
Nos últimos dois meses, ele desmamou por conta própria, aprendeu a beber leite e água no copinho e devora qualquer tipo de proteína animal. Asinha de frango e salmão são os pratos preferidos. Banana, uva e manga também são bem-vindas.
Eu me perco quando olho para esses olhos. Eles são lindos, compõem um olhar curioso e com uma vontade de viver imensa, do tamanho de quem passou por um turbilhão de coisas logo no comecinho da vida e tirou tudo de letra. Eu também olho para me observar, aprender com o Samuel e tentar entender o furacão que passa de maneira figurativa pela minha cabeça, enquanto ainda tento descobrir como equilibrar os pratinhos de profissional e pai, e tentar imaginar o que está por vir. É impossível saber e isso é uma dor e uma delícia.
A próxima versão é a 1.0 e que jornada será daqui pra frente.
Obrigado por tudo até aqui, filho.
Samuel v0.8
Na semana passada, que marcou o lançamento da versão 0.8 do Samuel, um bocado de coisas passou pela minha cabeça. Começa com todas as fics que já criei dentro da pasta “Projeções que pais e mães fazem para suas crias”. Algumas simples, outras mais elaboradas, todas sem o menor compromisso de tornarem-se reais.
Samuel pode ser um romancista que terá sua cadeira na Academia Brasileira de Letras, dada a sua capacidade de contar histórias. Ou um Relações Públicas de sucesso porque tem o sorriso fácil e o mais cativante já registrado. Finalmente, por conta das coxinhas, estou diante do kicker novato que dará ao Carolina Panthers o primeiro Super Bowl da história do time. (Para essa, tenho até a frase que será ouvida no ano de 2045 durante Draft, o recrutamento de novatos na NFL).
Esses devaneios são frutos do que vejo todo dia: aquele serzinho frágil dos primeiros dias agora é um bebê forte; expressivo com risadas, sorrisos e manhas – uma delas valeu um presente na loja de brinquedos do bairro – além de criativo e curioso.
O problema é que essa capacidade de inventar futuros é a mesma que cria ansiedades achando que coisas serão resolvidas em um passe de mágica. “Vrá!” e ele começa a gostar de comida e colocar coisas na boca. “Ping!” e ele começa a parar de engatinhar pra trás e começa a engatinhar pra frente.
Somar isso às réguas e validações externas da parentalidade perfeita de Instagram representa um risco. Acabo anulando essa observação mais apurada e a capacidade de perceber as nuances e os pequenos avanços, esses bem relevantes.
Quando amplio o olhar, percebo os avanços. Nos últimos dias, foi incrível perceber que ele me deixou colocar a escova de dentes em sua boca e limpar os três protótipos de dente. Mais do que isso, vê-lo devorar um hamburguinho foi um momento mágico. A curiosidade no sabor, a mastigação e os pedacinhos espalhados pela boca, rosto, mesinha, cadeira e chão. Uma cena digna de Discovery Channel, “cai a noite na floresta e o predador delicia-se com sua presa”, e também um poderoso lembrete de que é preciso respeitar o tempo da criança.
Respeitar o tempo do Samuel. Queimar etapas não vai acelerar nenhum processo, porque isso não é uma linha de montagem.
Só ajuda a criar ansiedades e parar de perceber a maravilha que é o seu processo de descobertas.
Avante.
Viver é muito louco
Samuel foi batizado no sábado, 23. Uma tarde recheada de amor e pessoas queridas. No meio do dia, lembrei que num 23/03, há três anos, recebi o diagnóstico da bola de golfe tumoral que morava na minha cabeça.
No carro voltando pra casa, falei com a Tutu que eu não precisava fazer mais planos. “Agora é hora de fazê-los“, foi a resposta.
Chegando em casa, falei com a Carol que ela podia ir embora, se quisesse. “Eu vou ficar“, foi a resposta.
Falei pra mim mesmo que estava poupado de mudar qualquer coisa, porque aparentemente eu ia morrer. Não morri.
Fiz planos, fizemos um filho e eu mudo e me reinvento.
Viver é muito louco. ❤️
Jam Sessions & Colabs – Ep. #08 – André Rosa
Bati um papo com o André Rosa, um parceiro de ensaios e palcos e um dos responsáveis por me dar as boas-vindas ao mundo do jazz.
Jam Sessions & Colabs – Ep. #07 – Fabi Nogueira
Um bate-papo sobre fotografia, direção e expressão com Fabi Nogueira.
A tarefa mais complexa
Samuel completou seis meses há alguns dias e eu pensei que valeria a pena fazer essa analogia.
Jam Sessions & Colabs – Ep. #06 – Natalia Franciscone
Nesse episódio, uma conversa muito legal sobre dança, fotografia e o poderoso momento do parto com a fotógrafa Natalia Fransciscone.